Tecnologia social supera barreiras e torna o letramento digital parte do dia a dia do professor

Publicado por Sinepe/PR em

A oferta de uma infraestrutura adequada possibilita que docentes desenvolvam projetos de maneira mais adequada quando o assunto é tecnologia

No cenário educacional brasileiro, no qual a internet continua acessível na maioria das escolas apenas na área administrativa e que, em média, um computador está disponível para cada 30 alunos (de acordo com Censo Escolar), aprender com e sobre tecnologia, na prática, com dispositivos e internet nas mãos de professores e estudantes, faz a diferença.

É o que tem acontecido na rede de Poços de Caldas (MG). Por meio de uma parceria público-privada com o Programa Ativamente, realizado pela empresa A Recreativa, que leva letramento digital a 100% das escolas municipais da cidade, registra não só a melhoria da infraestrutura, como também o investimento na formação continuada dos professores. A equipe docente vem desenvolvendo projetos focados no protagonismo dos estudantes que muitas vezes têm acesso a recursos digitais somente no ambiente escolar.

Formação voltada à criatividade
Roberta Tafarello, coordenadora pedagógica do Ativamente, explica que durante as sessões de formação, professores são apresentados a conceitos como aprendizagem criativa, cidadania digital, rotinas de pensamento e pensamento visível. O objetivo é apoiá-los na mudança de olhar o planejamento de aula e também identificar melhor o aprendizado em atividades com a presença de tecnologia. Segundo Roberta, esse tipo de suporte propicia que os educadores tenham mais confiança para experimentar e abrir espaço à criatividade em suas abordagens.

“Quanto mais próximo a gente estiver na formação do professor e trazermos mais repertório para ele – seja de programação, seja de pensamento computacional, aprendizagem criativa ou cultura maker –, ele vai enxergar em sua sala de aula onde estão as oportunidades para aquelas ideias que ele havia guardado e colocá-las em prática”, afirma.

Na proposta do Ativamente, o material didático oferece possibilidades de adaptação ao currículo. “O aluno não vai receber um livro fechadinho para seguir todo aquele passo a passo, então essa é uma ideia também para que o professor se adeque para aquele contexto”, pontua.

Antes de evoluir para o trabalho com computação e programação em sala de aula, Roberta explica que a formação do Ativamente traz para o debate a computação desplugada, que pauta as atividades lúdicas no primeiro e no segundo ano do ensino fundamental. A partir do terceiro ano, o perfil das atividades ganha características mais digitais.

Confiança para atividades plugadas e desplugadas
Um exemplo dessa proposta foi aplicado pela professora Leandra Cristina Ferreira do Amaral, da Escola Municipal Maria Ovidia Junqueira. Com a turma do primeiro ano, ela desenvolveu uma atividade na qual estudantes tinham que seguir orientações de uma bruxa (ela própria, fantasiada) para elaborar uma poção mágica. Como pano de fundo, estava o objetivo de desenvolver a habilidade de reconhecimento de padrões de sequência e repetição.

Outro impacto positivo da formação é o reconhecimento dos docentes, que dizem não ver mais a tecnologia como algo a ser vencido. A professora Simone de Cassia Pandolfo, que dá aulas de matemática no ensino fundamental 2 na Escola Municipal Sérgio de Freitas Pacheco, conta que a adaptação à tecnologia foi um processo gradativo e que hoje em dia a estimula muito.

“Antes nós tínhamos um tipo de aluno, que mudou durante a pandemia. Agora, nesse período pós-pandêmico temos também um tipo diferente de estudante, que requer novas habilidades”, diz a docente.

Ter uma escola preparada para este contexto também contribui para que a aula não fique dependente do modelo expositivo e de conteúdo isolado. Simone conta que a matemática geralmente “era vista como uma área ruim, que nem todo aluno gosta”. Ao adicionar o elemento robótica, porém, viu o interesse da turma mudar completamente de perspectiva. “Querendo ou não, as coisas estão interligadas. A parte dos circuitos e a tarefa de fazer maquetes são totalmente modelagem matemática”, conta.

A professora Simone destaca a importância de estar preparado, entendendo para quê servem cada um dos processos envolvendo robótica, programação e pensamento computacional. Antes de iniciar as atividades em aula, os docentes participaram de uma formação com este objetivo. “Foi como se a gente tivesse feito uma pós-graduação”, conta.

Ela fala do receio que sentiu no início, dado que se tratava de algo novo. “Porque você pensa assim: ‘Eu dou aula de matemática’, mas de repente entram ligações, circuitos, ligação de fio de LED, baterias… De uma forma que a gente nunca usou na sala de aula. Ficamos com um pouco de receio, mas aí com o tempo fomos vendo que uma coisa se encaixava com outra.”

Certa vez, Simone havia planejado uma atividade para ser feita em 30 minutos e, no entanto, os estudantes conseguiram finalizá-la em apenas dez. O que fazer com o restante da aula?

Por conta de situações assim, a professora acredita que precisa, cada vez mais, se preparar para questões que envolvem tecnologias digitais. A solução pensada ali na hora foi a criação de uma corrente de luzes de LED que deveriam piscar em uma determinada sequência. Foi material suficiente para continuar a aula de maneira rica.

Roberta pontua que durante as formações gosta sempre de enfatizar que as atividades não precisam ser soltas e podem se unir ao currículo. “Foi o que a gente tentou fazer com esse material, sempre se pautando ali com a BNCC (Base Nacional Comum Curricular)“, afirma.

Já na Escola Municipal CAIC (Centro de Atenção Integral à Criança e ao Adolescente) Professor Arino Ferreira Pinto, as atividades são realizadas em uma sala preparada pelo Programa Ativamente, com computadores e internet, seguida de uma proposta que também é adotada por professores de outras disciplinas, como de ciências.

“Nós tínhamos uma sala ambiente para a professora de ciências que pediu um espaço que pudesse usar de forma permanente com todos os alunos. Tivemos a sala ambiente do Ativamente e isso foi contagiando os outros professores para que cada um pudesse ter a sua sala”, descreve a diretora Juliana Perez Riemenschneider.

Em uma escola que combina processos tradicionais (“temos semanas de prova, nós temos calendário, nós temos semanas para entregar o boletim” e uma equipe disposta a criar, Juliana conta que o Ativamente trouxe “uma maneira diferente de trabalhar com os alunos”.

Entre os projetos desenvolvidos, Thais Morgana, pedagoga e arte-educadora responsável por aproximar o dia a dia da secretaria municipal de educação ao programa, lembra uma das atividades recentes com estudantes de sexto ao nono ano do CAIC. “Eles realizam toda a programação e depois, com blocos coloridos, fazem a parte física com sua própria construção e colocando a parte elétrica usando LEDs.”.

Menos resistência, mais autonomia
Durante o projeto, os professores contam com o acompanhamento de monitores que facilitam a conexão entre o currículo tradicional e as práticas apoiadas em tecnologia (plugadas ou desplugadas). Gradualmente, começam a se interessar e a ganhar autonomia.

Se alguns ainda resistem ao apoio da tecnologia, isso pode estar relacionado ao desgaste durante as aulas remotas no período de pandemia. “Quando o Ativamente chega, dizemos: ‘Olha, você já aprendeu. Agora é hora de continuar”, comenta Juliana

Com experiência de 30 anos na educação, a diretora do CAIC acredita que o ensino tecnologia é hoje um direito. “Todos esses benefícios que antes eram vinculados só a uma minoria da população devem ser abrangentes. Então por que não dar essa educação de qualidade para as nossas escolas públicas, para que os nossos alunos tenham acesso a tudo isso? É direito deles também”, conclui.

Por: Por Vir