“As escolhas que fizemos para as crianças foram terríveis”: um ano de ensino remoto no Brasil

Publicado por Sinepe/PR em

País entra no momento mais crítico da pandemia sem soluções para a educação e sem adotar os protocolos que permitiram que outros países retomassem as aulas. Atualmente, 95 nações mantêm as escolas abertas com limitações

O dia 23 de março ficou marcado na memória da pedagoga Leila Oliveira. Foi nesta data que, em 2020, as escolas públicas e particulares de São Paulo fecharam as portas pela primeira vez, na tentativa de conter o avanço do coronavírus. A medida afetou 3,5 milhões de crianças e adolescentes da rede estadual e 2,3 milhões de alunos da rede particular, sem contar os estudantes das redes municipais. São Paulo era o primeiro Estado a ser arrastado para dentro da crise sanitária e o fechamento das instituições de ensino afetou milhares de famílias. “Tive de sair da creche onde trabalhava em Campinas, não consegui conciliar o trabalho com as demandas do ensino híbrido das minhas filhas”, conta a pedagoga. “Eu podia me afastar, mas sabia que outras mães não podiam parar de trabalhar.”

Naquele momento, pouco se sabia sobre o vírus. Imagens de cidades na Itália sendo capituladas por um invasor invisível davam apenas uma mostra do que estava por vir. Oliveira faz parte do grupo de educadores que foi em busca de soluções para o fechamento das escolas. Dialogou com professores da Alemanha, Argentina e Portugal. A expectativa, naquele primeiro momento, era trocar boas práticas para que as crianças e adolescentes pudessem voltar à sala de aula o mais rapidamente possível. A possibilidade de um período longo de educação à distância não era atrativa para nenhum país.

Passado um ano, no que já é considerado o pior colapso hospitalar e sanitário da história, 18 Estados brasileiros ainda se veem obrigados a manter o ensino apenas de forma remota —seja por plataforma online, acessada por celular ou computador, ou mesmo rádio, televisão e apostilas impressas—, os demais tentam equilibrar uma forma híbrida entre o presencial e o ensino à distância. “As escolhas que fizemos para as crianças foram terríveis”, lamenta a professora. “A sociedade discutiu se devíamos ou não voltar à sala de aula, e não o que precisávamos fazer para poder voltar. Isso mostra a falta de compromisso brasileiro com as crianças.”

As justificativas difusas para a reabertura de escolas no Brasil não passariam, por exemplo, no crivo de quesitos utilizados por outros países, tais como: curva de contaminação descendente e uma política pública focada no ambiente escolar com regras sanitárias claras em relação a transporte público, alimentação e retorno para casa. Sem contar os protocolos de segurança caso nada disso dê certo. Esses critérios são baseados em um levantamento da consultoria Vozes da Educação, realizado em agosto de 2020 em uma amostra de 20 países. Naquele momento da pandemia, Alemanha, China, Dinamarca, França, Nova Zelândia, Portugal e Singapura mostravam os melhores resultados como países que reabriram as escolas sem registrar índices de contaminação fora do controle entre alunos e professores.

As novas variantes do vírus, aliadas a um afrouxamento das medidas de distanciamento social, fizeram com que alguns países tivessem que voltar atrás no plano de retorno de aulas presenciais. É o caso da Alemanha e Dinamarca, como mostra o mapa interativo do Banco Mundial, que acompanha em tempo real a situação das escolas no mundo. Os demais países que se destacaram na pesquisa no final do ano passado ainda mantêm as instituições de ensino abertas, mas com limitações.

Por: EL PAÍS