A matemática é vista como abstrata e chata, ‘mas nasceu para resolver problemas reais’

Publicado por Sinepe/PR em

Guillermo Ramírez é físico e matemático e, como grande parte dos cientistas, acumula vários títulos – de bacharelado a doutorado.

Mas o que é normal entre pesquisadores pode atrair o olhar curioso de quem não é.

A tendência é que as pessoas te admirem, como se você fosse um animal raro ou alguém muito especial, com uma vida muito diferente da delas. Mas não é verdade”, diz Ramírez à BBC News Mundo, serviço em espanhol da BBC.

“Não é preciso ser alguém muito especial ou muito inteligente para se dedicar à física ou matemática. São habilidades ou competências que podem ser desenvolvidas, assim como quando você pratica um esporte”, acrescenta.

Essa ideia socialmente estabelecida de que a física e a matemática são para “uma elite com habilidades especiais”, explica o mexicano, é algo que gera problemas práticos no dia a dia, além de inibir possíveis carreiras em duas áreas de trabalho altamente necessárias em meio à quarta revolução industrial.

Estes são alguns temas que o professor e pesquisador do Instituto de Matemática da Universidade Nacional Autônoma do México (UNAM) abordou na palestra “Matemática Viral” durante o Hay Festival Querétaro, realizado digitalmente de 2 a 7 de setembro deste ano.

Nem abstrato, nem distante
Ramírez é especialista em uma área da física chamada teoria da matéria condensada, “um campo bastante amplo que estuda as propriedades da matéria em sua fase sólida, líquida e gasosa, tanto a nível macroscópico quanto microscópico”, explica.

Na última década, ele começou a aplicar seus conhecimentos em matéria condensada e matemática para estudar a evolução de tumores malignos, sobretudo como o microambiente e o metabolismo influenciam o desenvolvimento do câncer de mama.

Esse é apenas um exemplo de como um campo que pode parecer teórico e distante tem implicações profundas na vida das pessoas.

Até a matemática, que segundo Ramírez é geralmente ensinada e, portanto, percebida como abstrata e chata, “nasceu para resolver problemas reais”.

Talvez o exemplo mais simples seja o da origem da aritmética diante da necessidade de um fazendeiro contar suas cabras – e depois trocar algumas delas por outros produtos, como maçãs.

Mas mesmo aquelas áreas que parecem desconectadas da vida cotidiana podem acabar transformando-a radicalmente.

É o caso da física (ou mecânica) quântica, diz ele, que estuda a natureza em escala atômica e subatômica, ou seja, o mundo das dimensões reduzidas e suas leis, muito diferentes daquelas que regem o mundo que somos capazes de enxergar.

“O desenvolvimento da mecânica quântica no início do século passado deu origem ao estudo do estado sólido da matéria, o que levou à invenção do transistor, dos microprocessadores, dos microchips, do computador, da internet”, explica o pesquisador.

“Sem a mecânica quântica”, acrescenta ele, “não viveríamos da forma como vivemos”. “Não teríamos telefones celulares e não estaríamos fazendo esta entrevista (via vídeoconferência) que, no início dos anos 1960, seria considerada história de ficção científica.”

“Nesta pandemia, se não fosse a quarta revolução industrial, estaríamos como na Idade Média durante a Peste Negra”, resume.

A revolução 4.0
A chamada quarta revolução industrial ou 4.0 não implica na chegada de novos desenvolvimentos em si, mas na convergência entre as tecnologias digitais, físicas e biológicas, segundo o Fórum Econômico Mundial, que possui um centro dedicado ao tema.

Esta é uma mudança importante em relação às três revoluções industriais anteriores.

Na primeira, ocorrida entre meados dos séculos 18 e 19, houve a transição da produção manual para a mecanizada.

“Foi impulsionada pela criação do motor a vapor e, com ele, de máquinas e utensílios que facilitaram a produção de determinados insumos”, afirma.

A segunda revolução industrial, por sua vez, “aconteceu quando essa produção de bens passou a ser feita em massa nas fábricas”. Naquele momento, o uso da eletricidade foi fundamental.

Por Portal G1