Escola, serviço essencial

Publicado por Sinepe/PR em

Bares, restaurantes, academias, shoppings, espaços de recreação infantil, todos em funcionamento. As escolas permanecem fechadas. E as crianças, onde estão? Depende.

As que podem, estão vivendo experiências alternativas de crescimento:muitas passaram meses em meio à natureza, em fazendas, casas de campo ou de praia, aprendendo a andar a cavalo ou de bicicleta,convivendo mais com seus pais e tendo aulas particulares,entre outras atividades que o dinheiro e um pouco de criatividade e organização podem proporcionar. Sem contar com o acesso de qualidade ao ensino a distância- oferecido por suas escolas que se reinventaram da noite para o dia, investiram e capacitaram professores para tal. Não estou minimizando a complexa rotina das famílias,nem o impacto emocional em muitas dessas crianças. Mas, mesmo privadas das aulas presenciais e do contato com seus amigos, elas terão perdido relativamente pouco nesse isolamento, e o que perderam, terão o privilégio de recuperar.

E as crianças que não podem? Estão na rua ou isoladas em barracos onde chegam a dormir 12 pessoas por cômodo que passaram o dia também “isoladas” na rua. E sua agenda de crescimento e cuidado, retirada das mãos da escola, fica bastante comprometida. O fechamento das escolas oferece riscos enormes à saúde e ao bem estar das crianças, agravando condições psiquiátricas, comprometendo a segurança alimentar, aumentando a taxa de gravidez infantil, o número de abusos e maus tratos, uso de drogas e violência. Nos EUA, potência econômica, 2/3 das necessidades nutricionais das crianças são supridas pela escola1. Imaginem no Brasil.Sem considerar ainda a situação de muitas mães que perderam seus empregos por não ter onde deixar seus filhos. Enfim, salvo uma minoria dos que podem, as demais crianças e jovens terão perdido muito, irão recuperar pouco e a desigualdade de oportunidades só irá aumentar.

Tenho dificuldade para entender as decisões recentes de manter as escolas fechadas. Aprendi nesses tempos do novo coronavírus que prevalência, gravidade e transmissibilidade são três questões fundamentais em estudos sobre epidemias. A Covid-19 é significativamente menos prevalente em crianças (cerca de 24% da população mundial), representando apenas 2% dos casos globalmente2.Em crianças a doença é pouco agressiva, com mais de 90% sendo assintomáticas, e menos de 0,1% de óbitos3. E finalmente, estudos sugerem que elas contribuem menos para a cadeia de transmissão, mesmo quando frequentam a escola.

Então pensemos nos professores das escolas, públicas ou privadas, que terão que pegar transporte público para ir ao trabalho. Me pergunto como se locomovem garçons, recepcionistas de academias, enfermeiros, bancários, operador do chão de fábrica, funcionários de manutenção de escolas (sim, estão trabalhando!), entre outros trabalhadores. Lavar as mãos antes de sair de casa e ao chegar ao trabalho e usar máscara no metrô e no trabalho são cuidados que funcionam e ajudam a prevenir a transmissão da doença entre a população, incluindo professores.Penso no que ocorreria se enfermeiros e médicos decidissem não trabalhar.

O professor (que não seja grupo de risco) que escolhe não retornar ao trabalho nas escolas com condições de oferecer um ambiente seguro, influencia seus colegas de profissão, agravando a situação das crianças socialmente vulneráveis e o fosso de aprendizagem e experiências entre ricos e pobres.Não reconhece o seu trabalho como essencial para a sociedade. Desconsidera que sua função vai muito além de sua capacidade e vocação para lecionar. Ele cuida, denuncia o abuso, acompanha as refeições, conversa com afeto e empatia, escuta a criança e o jovem. E ele pode fazer tudo isso minimizando riscos de se contaminar e de contaminar seus alunos, desde que siga rigorosamente os protocolos de segurança de sua escola, obedecendo escala de horários, uso de equipamentos de proteção individual, distanciamento, medidas de higiene entre outros.

O ano não está perdido. Não estamos já em setembro! Estamos ainda em setembro!! Temos 4 meses de 2020 pela frente, 1/3 do ano, há muito que pode ser feito. Cabe às autoridades, pautadas pela Saúde e pelo reconhecimento de que educação é serviço essencial, a autorização da data de retorno. Cabe às famílias, a decisão sobre levar seus filhos para a escola. Às escolas privadas e ao Governo, a responsabilidade de prover um ambiente seguro para alunos, professores e funcionários. E a nós, pais, educadores, e cidadãos, uma mobilização urgente em prol das crianças e jovens do nosso país. Ainda dá tempo.

Por Abepar