Como organizar a rotina na alfabetização

Publicado por Sinepe/PR em

Veja exemplo de como planejar a semana em atividades permanentes, sequências didáticas e projetos

O ano letivo já está a pleno vapor. O planejamento do professor alfabetizador precisa estar alinhado com as necessidades de aprendizagem para desenvolver a escrita e leitura – além das habilidades previstas em outros componentes curriculares. Equilibrar essas demandas com os diferentes níveis de conhecimento na turma é uma tarefa desafiadora, mas fundamental para manter a turma avançando.

Para dar conta desse trabalho, seguindo as modalidades organizativas propostas por Délia Lerner, organizo minha rotina em: atividades permanentes (aquelas realizadas com frequência, seja todos os dias, semanal ou quinzenalmente), sequências didáticas e projetos. As duas últimas têm como ponto positivo o fato de serem propostas dinâmicas, que aumentam a complexidade conforme o avanço dos estudantes.

As crianças podem trabalhar com foco em um objeto de estudo por semanas ou meses, sempre voltando para ele com o intuito de aprimorar o que se aprende. Um exemplo são os projetos de produção de textos, em que durante as etapas os estudantes podem ler vários textos do mesmo gênero, escrever individualmente e revisar, por meio do “ditado do professor” (situação em o professor é o escriba) ou em dupla. Ao final desse processo, o conhecimento produzido é muito rico.

Exemplo de como montar a rotina da alfabetização

Este ano tenho planejado desenvolver um projeto de indicações literárias e, ao menos, duas sequências didáticas voltadas para o sistema de escrita em cada semestre. Acredito que a turma necessita avançar em seus conhecimentos nesses dois aspectos, pois preciso atender as necessidades tanto dos que já têm uma escrita alfabética quanto os que ainda não consolidaram a alfabetização.

Há indicação das especialistas (que na prática pude provar e aprovar) de que as sequências didáticas e os projetos sejam trabalhados de duas a três vezes na semana. Isso significa que, se na terça e quinta desenvolvo as etapas do projeto, na segunda e na quarta, desenvolvo as etapas da sequência didática. Essa organização também contribui para o engajamento das crianças. Elas ficam animadas ao saber que voltarão com frequência para aprender aquilo que está sendo desenvolvido em um projeto, por exemplo.

Vale destacar que é como organizo minha rotina. Nem todas as propostas curriculares se baseiam nessa organização por modalidades organizativas do tempo didático (projetos, sequências didáticas, atividades permanentes). Portanto, é preciso “encaixar” nossa concepção de aprendizagem com o trabalho proposto pelo material oficial da rede em que trabalhamos. O que podemos fazer (e devemos) é fazer uma análise com antecedência desses instrumentos para identificar as possibilidades de integração. Isto é, comparar as habilidades previstas nas atividades dos materiais da rede com aquelas planejadas em um projeto ou sequência didática que pretende desenvolver.

Vamos imaginar, por exemplo, que está previsto no material uma produção coletiva de bilhetes por meio do ditado ao professor. No seu planejamento, planeja uma escrita coletiva de indicações literárias. Ambas as propostas estão relacionadas. Pode ser que esteja se perguntando: como coincidem se são gêneros textuais diferentes?

O que há em comum não é o tema ou gênero textual, mas a habilidade de se pensar na linguagem que se escreve. Em ambos os casos, o professor precisa colocar seus estudantes em situações que exigem tomar decisões sobre “o que escrever” e “como escrever”. É o mesmo processo do escritor e revisor envolvido em escolher as melhores palavras e expressões para quem vai ler o bilhete ou a indicação literária. Ambos os trabalhos têm respaldo na Base Nacional Comum Curricular (BNCC).

Por que comunicar o planejamento com os alunos

Essa relação mencionada acima pode ser utilizada na hora de propor a atividade, por exemplo: “Hoje faremos como ontem na escrita do bilhete: vocês irão ditar e eu escreverei o texto da turma na lousa. Ontem fizemos essa mesma atividade com os bilhetes, lembram? Hoje, faremos com a indicação literária que estamos estudando há alguns dias.”

Esse discurso também visa garantir que o planejamento de trabalho seja apresentado para a turma. Os alunos precisam se sentir coprodutores, entender a lógica por trás daquela proposta.

As crianças gostam disso! Meus estudantes perguntam: “Hoje vamos trabalhar o quê? Vamos ler de novo o bilhete que escrevemos para ver se já está pronto para enviarmos”. Cria uma expectativa, motivando-os para o que será realizado naquele dia.

Flexibilidade em relação ao que foi planejado

Muitas vezes nem tudo sai como previsto. Às vezes chegam outros temas urgentes a serem priorizados – seja por uma necessidade identificada por nós, pela gestão escolar ou pela secretaria de educação. Essas mudanças exigem analisar como essa demanda se encaixa no planejamento inicial.

Minha dica é buscar contextualizar da melhor maneira possível para os alunos. Esforçar-se para fazer relacionar com o que os estudantes já estão aprendendo, não deixar que a atividade “surja do nada”, sem que eles entendam por que está propondo aquilo.

Um exemplo pode ser o bullying, tema que vem sempre rondando a escola e que volta à tona quando acontece um caso. Caso eu precisasse incluir uma atividade sobre o assunto, eu escolheria a produção de um panfleto para a comunidade ou uma postagem para redes sociais. Afinal, se estamos trabalhando “produção de textos”, a escrita com um tema urgente seria uma boa estratégia a ser utilizada, pois eles dariam continuidade ao que estavam fazendo anteriormente, com o desenvolvimento de determinadas habilidades.

Equilibra os objetivos de aprendizagem na alfabetização

Também é importante garantir que durante a semana planejemos propostas baseadas nas quatro situações fundamentais para ensinar a ler e escrever:

A leitura pelo professor

Nossa velha conhecida não pode faltar todos os dias, tanto nos momentos de leitura de textos literários como também na leitura de outros gêneros textuais, como os científicos, por exemplo.

A leitura pelo estudante

No caso das crianças que ainda estão aprendendo a ler, estamos falando de atividades em que os estudantes “aprendem a ler lendo” – o que é feito, por exemplo, com propostas de localização de palavras em listas, leitura de ajuste de textos que se conhece de memória, como cantigas e parlendas.

A escrita por meio do professor

Trata-se de quando os alunos ditam para o professor o que querem escrever. Mesmo antes de saberem escrever convencionalmente, eles são desafiados a produzirem textos de diferentes gêneros textuais tendo o professor como escriba.

A escrita pelo estudante

Seja individual ou em duplas, este tipo de atividade é essencial para estimular que as crianças reflitam a respeito do sistema de escrita.

Em minhas turmas, dou preferência para a realização deste tipo de proposta em duplas produtivas, nas quais as duas têm hipóteses de escritas diferentes, porém próximas, o que permite que uma aprenda com a outra. Tenho visto que o avanço é sempre mais rápido quando refletem em pequenos agrupamentos, pois neles precisam dizer o porquê estão escrevendo daquela forma (justificar a escrita), a troca de conhecimentos acrescenta e consolida aprendizagens, aprendem a trabalhar em parceria e se apropriam de procedimentos, como por exemplo, o apoio para escrita em palavras estáveis.

O planejamento da rotina de alfabetização de acordo com cada contexto, cada escola, cada rede sempre é bem desafiador. Porém, quando nos propomos a estudar com cautela os objetivos que temos para o trabalho que queremos e devemos desenvolver, o equilíbrio de todos os elementos torna-se possível e proporciona para os estudantes uma sequência lógica de propostas para aprendizagem.

Por: Nova Escola