Volta às aulas: como acolher e motivar os alunos dos Anos Iniciais?

Publicado por Sinepe/PR em

Período é importante para conhecer as crianças, engajar as turmas e propor atividades que explorem as potencialidades de todos e de cada um

No início do ano letivo, reintegrar os alunos após o período de férias é o primeiro passo para estabelecer as bases de uma relação sólida com a turma, que vai moldar todo o restante do período. Não se trata de o professor apenas retomar os conteúdos curriculares, mas de criar um ambiente acolhedor que motive e estimule o desenvolvimento acadêmico, emocional e social das crianças.

Segundo a educadora Maria da Paz de Castro Nunes Pereira, conhecida como Gunga, formadora de professores e especialista em inclusão, os primeiros dias podem ser decisivos para fazer com que as crianças se sintam bem no espaço escolar e queiram estar ali todos os dias. “Esse contato com a escola [no caso dos alunos novos], com a nova turma e com o novo professor cumpre um papel de ‘cartão de visitas’, em que a instituição precisa se mostrar como ela é realmente.”

Nessa perspectiva, buscar estratégias para acolher e motivar os alunos proporciona um retorno mais engajado e positivo. A educadora lembra que o início do ano é sempre muito aguardado, então é natural que eles se sintam ansiosos, curiosos e cheios de expectativas.

Maria Gabriela Souza, professora da EMEF Saint-Hilaire, em Porto Alegre (RS), destaca que a escola é o principal espaço de socialização das crianças e adolescentes, o que faz da volta às aulas um momento de (re)encontro e de (com)partilhar as experiências. “Nas comunidades escolares periféricas, por exemplo, a escola assume, ainda mais, um papel fundamental nas relações sociais. Como um dos lugares de aprendizagem, é o espaço em que se oportuniza a mediação para as visões de mundo e a compreensão da cultura.”

(Re)conhecendo os alunos

Nas propostas de atividades para receber os alunos no retorno à escola, Gunga aponta que, nem sempre, ser original é o mais importante. “Muitas vezes, as crianças esperam por ações já vividas em outros momentos de volta às aulas, e que nunca mais foram oferecidas. O que é fundamental é viabilizar propostas que permitam a elas falar, se apresentar e conhecer as novidades do ano que se inicia”, explica.

Uma roda de conversa pode funcionar, pois as crianças se apresentam e fazem perguntas. “Mas essa possibilidade precisa ficar clara [para fazer o aluno perguntar]. E o professor também deve se apresentar, levar fotos, falar de suas preferências – o que gosta de comer, de fazer, para qual time torce”, completa.

A professora e alfabetizadora Luciana Domingues Ramos, que atua na Educação Infantil e no Ensino Fundamental na EMEF Professor João Carlos Von Hohendorff, em São Leopoldo (RS), reforça que o acolhimento transmite segurança para o início dos trabalhos. Assim, ela defende que as famílias também participem desse momento, levando suas dúvidas e mostrando que são parte da jornada de aprendizagem de seus filhos. “[É importante] planejar situações de integração, em vez de chamar os responsáveis somente para receber recados e reclamações. Sou muito adepta desse estreitamento das relações, pois isso se reflete no comportamento que o aluno terá na escola.”

Atividades lúdicas para envolver as turmas

Uma maneira de sair do lugar comum e diversificar a interação com os estudantes é trabalhar com abordagens lúdicas, que investiguem os sentimentos mais presentes nesse início do ano. “Gosto de espaços e propostas que me possibilitam observar como o aluno é, o que ele gosta, quais assuntos chamam sua atenção e o que ele espera da escola”, diz Luciana.

Maria Gabriela tem essa mesma percepção. “Eu aposto na brincadeira como ação pedagógica para estabelecer vínculos iniciais com os alunos. “A brincadeira é uma forma de promover o movimento do corpo para o autocuidado e autoconhecimento. O brincar subsidia uma aprendizagem prazerosa na educação.”

Luciana descreve seus primeiros dias com os estudantes, em que propõe sequências com jogos, chamadas, rodinhas de conversa e brincadeiras, em que todos podem falar e ouvir. “O assunto pode partir de uma leitura, um jogo, um vídeo ou uma música, e assim vamos apurando preferências, referências, personalidades que admiram, expectativas com a escola e mais.”

Ela também relata experiências de contato com os alunos antes do primeiro dia de aula – e que deram certo. “Em algumas ocasiões, eu estive na escola no dia da matrícula, mandei mensagem de boas-vindas no grupo da turma, publiquei um vídeo pela página da escola e até já escrevi cartas”, recorda. “A ideia era contar que eu seria a professora deles, que também estava ansiosa para conhecê-los, e fazer um convite para o primeiro dia de aula. Procurei fazer cartas coloridas e divertidas e percebi que mobilizei muito as crianças e as famílias.”

Um diálogo diferente

No caso das turmas que têm alunos com deficiência, Julci Rocha, doutoranda em Tecnologias da inteligência e Design digital e diretora da Redesenho Edu, afirma que é preciso entender as necessidades específicas de cada criança e as condições de participação nas atividades propostas. “Se elas não forem impeditivas à participação, não há necessidade de adequações. Mas poderá ser preciso rever, por exemplo, a organização do espaço, dos materiais, das orientações e do apoio para a realização.”

Também é possível conversar com os familiares desses estudantes para conhecer as principais demandas. Quando isso for mapeado, a ação seguinte é fazer com que o restante da turma entenda e participe da integração. “O professor pode construir essa relação aos poucos e ir sanando as necessidades à medida que elas aparecem”, diz Julci.

Para Gunga, apesar de essas crianças terem demandas específicas, elas devem ser recebidas como todas as outras. “O cuidado que devemos ter é não deixar que os seus laudos, adjetivos e dificuldades entrem na classe antes [delas]. Elas vão mostrar a melhor forma de ‘estar’ na escola e no grupo, e cabe ao professor deixar que elas indiquem [esse caminho].”

A formadora acrescenta que, caso se sintam curiosas, as outras crianças vão fazer perguntas, e o professor, nessas horas, pode mediar o diálogo. “Mas nunca dizer que esse estudante ‘é especial e precisa de ajuda’. Deixe que ele mesmo diga”, orienta.

Investigar, planejar e executar

Todos os conhecimentos que os professores adquirem com as atividades iniciais de interação produzem informações sobre os perfis das turmas e ajudam a montar agrupamentos mais produtivos em atividades futuras. Conforme lembra Gunga, os primeiros dias podem contribuir no sentido de perceber algumas preferências e competências dos alunos, como o interesse por áreas específicas, gostos ou se já escreve, se gosta de histórias etc.

O mesmo ocorre com as atividades de sondagem e diagnóstico, que são cruciais para o planejamento do ano letivo. “Elas devem se voltar aos pré-requisitos de conhecimento para que haja um bom aprendizado ao longo do período. Atividades mais livres e lúdicas, como jogos ou gamificações, podem ser boas aliadas para esses momentos de sondagem”, sugere Julci.

A professora Luciana reitera que é a partir do acolhimento, da integração e da observação que se encontram elementos para ajudar nos diagnósticos de aprendizagem e estruturação do plano de trabalho. “[Ao conhecer as turmas], conseguimos prever reações a cada tipo de tarefa e pensar em ações que possam motivá-los. Certamente, haverá reflexo das experiências iniciais em todo o restante do ano”, conclui.

Por: Nova Escola