Superproteção dos pais pode diminuir expectativa de vida dos filhos, mostra estudo; entenda

Publicado por Sinepe/PR em

Pesquisadores da UFSCar também descobriram que pessoas que foram negligenciadas na infância correm maior risco de morte prematura

A superproteção dos pais pode ter um inesperado e indesejado efeito colateral em seus filhos. De acordo com estudo publicado recentemente na Scientific Reports, filhos de pais superprotetores ou autoritários tendem a viver menos, segundo informações da Agência Fapesp.

Estudos anteriores, na área de psicologia e parentalidade, já apontavam que relações autoritárias ou extremamente rígidas e negligentes ou permissivas podem ser prejudiciais para a formação do indivíduo. Mas essa é a primeira pesquisa a verificar como a ausência ou o mau relacionamento com os pais é capaz de reduzir a longevidade

O novo trabalho, realizado pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) e pela Universidade College London, no Reino Unido, com apoio da FAPESP, analisou dados de 941 casos de óbito (445 mulheres e 496 homens) entre os participantes do Estudo Longitudinal de Saúde da Inglaterra (Elsa, na sigla em inglês).

Antes de morrer, os voluntários responderam a um questionário com informações sobre estrutura familiar, condições de moradia, ocupação do chefe da família, presença de doenças infecciosas e relacionamento com os pais (cuidado e proteção) na infância e adolescência.

Os resultados mostraram que homens que tiveram um pai superprotetor, que tirava sua autonomia, durante a infância e a adolescência, apresentaram um risco 12% maior de morrer antes dos 80 anos do que aqueles que não tinham um pai com essa característica. Entre as mulheres, a taxa foi de 22%.

Por outro lado, as mulheres que receberam um alto nível de cuidado da mãe durante a infância e adolescência, apresentaram risco 14% menor de morrer prematuramente do que as que foram negligenciadas. O pai não foi associado ao alto nível de cuidado, apenas a mãe.

— O mais interessante do nosso trabalho é que conseguimos mostrar em números o que já vem sendo discutido há alguns anos sobre parentalidade. As relações de cuidado e afeto com o pai e a mãe durante a inf’ncia e a adolescência têm repercussão na vida inteira, inclusive, como mostramos, impactam na longevidade. Com os resultados do nosso estudo comprovamos que as condições na inf’ncia precisam ser muito bem cuidadas e apoiadas por políticas públicas para que a velhice seja boa — disse Tiago Silva Alexandre, professor do Departamento de Gerontologia da UFSCar e coordenador da pesquisa, à Agência Fapesp.

De acordo com os pesquisadores, relações parentais intrusivas tiram a autonomia dos filhos, deixando-os enfraquecido, devido ao medo dos pais. Isso acarreta em condições prejudiciais, que vão desde hábitos não saudáveis, como maior risco de abuso de álcool e drogas, até questões psicológicas, como aumento do estresse, que também está associado à diminuição da longevidade.

A pesquisadora Aline Fernanda de Souza Canelada, que participou da pesquisa durante o mestrado, explica que as mulheres parecem ser mais propensas a internalizar emoções negativas e, portanto, apresentam com maior frequência transtornos mentais. Já os homens parecem ter maior propensão ao alcoolismo e uso de drogas. Ambos são associados com a longevidade.

O estudo também descobriu que os homens que passaram a inf’ncia ou adolescência morando somente com um dos pais tiveram um risco 179% maior de morrer antes dos 80 anos, quando comparados àqueles que viveram com ambos os genitores.

— “Sabemos por meio de estudos na área da psicologia que todos esses fenômenos relacionados à relação parental mexem com o comportamento. Existe uma teoria que relaciona isso ao estresse. As pessoas que foram negligenciadas podem estar vivendo um nível de estresse ao longo da vida por conta dessas condições do passado, que vão reverberando. Isso aumenta a chance de desenvolverem doenças — afirmou Alexandre.

As análises de mortalidade precoce realizadas pelos pesquisadores são independentes das condições de doença e idade. Outro dado a ser ressaltado é que os participantes incluídos nessa análise nasceram na década de 1950 e 1960. Portanto, os resultados são um retrato de indivíduos que hoje teriam uma idade mais avançada e não permite afirmar que eles valem para a geração atual.

Mesmo assim, a recomendação para os pais é achar o meio do caminho.

— Nem ser intrusivo a ponto de fazer com que a criança ou adolescente perca a autonomia, nem ser negligente e distante emocionalmente dos filhos. Essa questão do cuidado que tratamos neste estudo é justamente não negligenciar, cuidar com zelo, ser presente, mas não superproteger — disse Canelada, que participou da pesquisa durante o mestrado.

Por: O Globo